Iwata Asks com Shigeru Miyamoto - Parte 1: Mario Não Iria Pular

A última edição de Iwata Asks, a sessão de entrevistas do presidente da Nintendo, Satoru Iwata, com desenvolvedores, músicos e membros envolvidos com os video games, trouxe ninguém mais, ninguém menos que Shigeru Miyamoto em sua sala pra conversar sobre New Super Mario Bros. Wii. Em tradução exclusiva, o Reino do Cogumelo mostra a todos os fiéis leitores as origens de Mario, incluindo a história sobre como ele começou a pular, narradas pela mente brilhante de seu criador joínha, Shigeru Miyamoto. Confira após o pulo a primeira parte dessa gloriosa e reveladora entrevista.

Iwata: Nesta entrevista, vamos falar sobre New Super Mario Bros. Wii, mas ao invés de ir direto à discussão desse novo título, eu gostaria de começar a falar sobre as raízes do Mario. Com certeza vão haver muitos leitores que sabem tudo sobre isso, mas acho que ainda existem pessoas que estão completamente nas sombras a respeito de como o Mario começou.

Miyamoto: É, você está certo.

Iwata: Devemos começar falando sobre o período da concepção inicial de Mario, quando ele era conhecido como "Jumpman"?

Miyamoto: Claro. Agora, isso é algo do qual eu fui questionado em centenas de entrevistas, então vou fazer isso rápido! (risos) Na era de Pac-Man, havia um grande número de jogos que eram muito populares nos fliperamas. A Nintendo tinha lançado títulos como Sheriff, mas nenhum deles conseguiu alcançar o nível de popularidade pra que você pudesse chamá-los de hits.

Iwata: Isso aconteceu quando a Nintendo ainda tinha que lançar o Nintendo Entertainment System e enquanto a companhia tinha feito um número de máquinas de arcade; nós ainda éramos incapazes de produzir um hit.

Miyamoto: Isso aí. Então foi a esse ponto que o presidente da Nintendo na época, Yamauchi-san, nos disse: "faça jogos que vendem mais!"

Iwata: "Faça jogos que vendem mais!" Mas que tarefa ele te deu! (risos)

Miyamoto: Foi uma bela tarefa, sim! (risos) Então decidimos pesquisar sobre o que fazia com que os títulos "hit" fossem tão populares. Bem, quando eu digo "pesquisar", me refiro a jogar! (risos)

Iwata: Jogar em nome da pesquisa! (risos)

Miyamoto: Como você pode imaginar, eu era um grande fã de jogos. E ainda, enquanto hoje em dia existem muitas pessoas na Nintendo que são jogadores de video game altamente habilidosos, na época eu era um dos melhores.

Iwata: As pessoas se reuniriam pra te assistir jogando nos fliperamas, não é?

Miyamoto: Antes mesmo que eu soubesse, havia uma multidão ao meu redor!

Iwata: Já até houve uma época em que as pessoas se reuniam à minha volta, sabia!

Miyamoto: Naquela época, jogos de "comer pontinhos" predominavam, e Pac-Man era o mais conhecido do gênero...

Iwata: Sim, nos fliperamas da época você encontraria um número de jogos baseados em comer pontinhos.

Miyamoto: Certo. Ao mesmo tempo, você também via a emergência de jogos de rolagem lateral onde seu personagem poderia correr pra frente. Como eu originalmente era um designer industrial, eu analisava esses jogos enquanto os jogava, tentando imaginar o que colocava os jogos juntos pra fazê-los divertidos e fazer com que as pessoas desejassem jogá-los de novo.

Iwata: Então você queria saber o que é que fazia os jogadores inserirem outra moeda de 100 yen depois do jogo ter acabado?

Miyamoto: Certo. E basicamente, eu concluí que isso nasceu com o jogador ficar bravo consigo mesmo. Então eu tentaria analisar sobre como o jogo fazia os jogadores se sentirem daquele modo. Foi quando eu estava ponderando sobre essas questões que um colega sênior, Gunpei Yokoi, foi bom o bastante pra me explicar um monte de coisas. Eu não quero mergulhar em todos os detalhes sobre as dificuldades do design de jogos, então vou pular essa parte. De qualquer modo, até aquele ponto, eu estive trabalhando como um design gráfico para jogos desenvolvidos por outras pessoas...

Iwata: Então você estava desenhando imagens pixeladas e criando as figuras usadas nos fliperamas...

Miyamoto: Eu estava envolvido em fazer jogos pra fliperamas, mas o tipo de ideias que eu estava sugerindo não estavam sendo utilizadas... Mas então, tive sorte o bastante pra ser confiado no desenvolvimento inteiro de um título de software...

Iwata: Então esse foi o grande ponto de virada no seu desenvolvimento como designer de jogos?

Miyamoto: Certo. E foi quando, tendo analisado rigorosamente o que exatamente fazia com que as pessoas quisessem jogar uma outra vez, eu rascunhei ideias pra cinco jogos. A esse ponto, a Nintendo tinha a licença pra produzir Popeye.

Iwata: Sim, a companhia estava lançando cards do Popeye e títulos do Popeye pra Game & Watch.

Miyamoto: É por isso que perguntei se eu poderia fazer um jogo usando Popeye. O conceito básico de Popeye é que existe o herói e seu rival, a quem ele consegue enfrentar com a ajuda do espinafre.

Iwata: Quando você coloca desse modo, fica parecido com Pac-Man, né? (risos)

Miyamoto: É, é idêntico ao Pac-Man! (risos) Então eu rascunhei algumas ideias pra jogos usando Popeye. A esse ponto, Yokoi-san foi bom o bastante pra trazer essas ideias à atenção do presidente, e, no fim, uma das ideias recebeu aprovação. Yokoi-san achou que os designers se tornariam membros necessários dos times de desenvolvimento pra poderem fazer jogos no futuro. E foi assim que Donkey Kong surgiu.

Iwata: Mas originalmente, era pra ser um jogo do Popeye.

Miyamoto: Correto. Mas enquanto eu não consigo me lembrar exatamente do porquê, não podíamos usar Popeye naquele título. Nós sentimos como que a escada tivesse sido tirada de baixo de nós.

Iwata: Então mesmo embora você estivesse fazendo um jogo sobre subir escadas, você teve a escada retirada de baixo de você até mesmo antes de começar! (risos)

Miyamoto: Essa foi ótima! Você merece aplausos de pé por essa! (risos) Enfim, na época nós estávamos perdidos sobre como proceder. Então, nós pensamos: "Por que não dar vida a um personagem original?"

Iwata: Então basicamente Donkey Kong e Mario surgiram quando a escada foi retirada de baixo de vocês.

Miyamoto: Exatamente.

Iwata: Miyamoto-san, você realmente leva uma vida encantada!

Miyamoto: Foi um lance de sorte! Então, depois, começamos a dar vida ao jogo baseado no conceito que tínhamos criado. Agora, um jogo divertido deve ser sempre fácil de se entender - você deve ser capaz de dar uma olhada nele e saber o que tem de fazer, de primeira. Deve ser bem construído de modo que você possa dizer em um olhar qual é o seu objetivo, mesmo se você não tiver sucesso, você vai culpar a si mesmo ao invés de culpar o jogo. Além do mais, as pessoas assistindo o jogo ao seu redor também devem se sentir entretidos. Esses foram os tipos de questões que discuti com Yokoi-san.

Iwata: Então vocês estavam analisando o que fazia com que os jogos fossem divertidos de se jogar.

Miyamoto: Sim, nós estávamos. Digamos, por exemplo, que exista uma ação no jogo que o jogador pode fazer facilmente. Então, vamos adicionar mais uma ação simples. Essas ações podem ser simples, mas quando é requisitado que o jogador faça as duas ações ao mesmo tempo, se torna muito mais complicado.

Iwata: Então enquanto essas duas ações poderiam ser fáceis de realizar sozinhas, quando tentar fazê-las simultaneamente, fica mais difícil. E é precisamente pelo fato de você achar ser fácil que você vai ficar nervoso consigo mesmo quando não consegue realizar direito, certo?

Miyamoto: Precisamente. Então digamos que exista um número de declives desiguais e sobrepostos...

Iwata: Onde você tinha que subir ladeiras, pular e por aí adiante.

Miyamoto: Então, você vai se concentrar em chegar em segurança ao seu objetivo usando atalhos, enquanto constantemente tenta prevenir a rota que os barris tomam enquanto rolam. É fácil desviar dos barris rolantes. Mas é quando você tenta fazer essas coisas ao mesmo tempo que se torna desafiante. Além disso, você tambpem está pensando sobre como tomar a rota mais curta o possível, então fica ainda mais difícil. Nós achamos que poderíamos trabalhar com esse conceito. Foi nesse ponto que tentamos fazer a tela rolar e dissemos: "essa prancheta não rola!" (risos)

Iwata: A "prancheta" [board] que você mencionou é a prancheta de circuito dentro da cabine do jogo de fliperama. Naquela época, havia uma quantidade justa de individualidade, digamos, em cada máquina e, dependendo do tipo específico de hardware, havia limitações a serem impostas. Quando você começasse a trabalhar com Donkey Kong, a cabine, que você deve usar, incluía uma prancheta, que não permitia com que os jogos rolassem.

Miyamoto: E como queríamos que o jogo fosse jogado em pelo menos quatro telas conectadas, simplesmente nos referíamos a elas como "rolagem" (risos).

Iwata: Então o fato de que Donkey Kong possui quatro fases vem de seu desejo original de fazer a tela rolar?

Miyamoto: Sim, correto. O supervisor técnico da época nos perguntou o que é que estávamos pensando. "Uma só tela é como se faz um jogo regular! Mas você está fazendo quatro telas separadas! Você pode, assim, nos pedir pra fazer quatro jogos diferentes!"

Iwata: Mas você estava doido pra fazer desse jeito.

Miyamoto: Sim, eu estava. Eu também me lembro que a cabine que estávamos fazendo tinha um joystick e um botão, mas inicialmente eu pretendia que fosse controlado somente com o joystick.

Iwata: Então o que você está dizendo é que, se a cabine não tivesse um botão, Mario não poderia pular? Você não pode imaginar Mario sem pensar nele pulando! (risos)

Miyamoto: Bom, talvez esse foi o caso. Originalmente era um jogo onde você tinha que escapar de um labirinto. Permitir que os jogadores pulassem pra desviar dos perigos teria estragado o elemento estratégico no jogo. Mas quando nós pensamos: "se você tivesse um barril rolando na sua direção, o que você faria?"

Iwata: Naturalmente, você pularia por cima dele! (risos)

Miyamoto: Claro que você pularia por cima dele! (risos) Então decidimos usar o botão pra permitir com que jogadores pulassem e, quando fizemos o protótipo pra testar, ele funcionou perfeitamente. Acho que se eu não tivesse permitido com que Mario pulasse, esse teria sido um jogo horrendamente difícil de jogar.

Iwata: Você teria de se focar em desviar dos barris enquanto subir pelo labirinto. Isso teria requisitado uma quantidade enorme de determinação.

Miyamoto: Também, se fizéssemos assim e você pudesse pular pressionando pra cima no joystick, o nome "botão de pulo" nunca teria surgido! No segundo estágio, nós tínhamos plataformas verticais e estávamos preocupados sobre como fazer com que o jogador chegasse nelas. Mas se Mario pulasse...

Iwata: Então chegar e sair delas seria um piscar de olhos! (risos)

Miyamoto: Foi daí que decidi fazer o pulo, que funcionou muito bem.

Iwata: Permitindo com que Mario pulasse, você também poderia resolver múltiplos desafios ao mesmo tempo.

Miyamoto: Nós também pudemos fazer uso daquele botão reserva! (risos) E essa é a história de como o Mario se tornou capaz de pular.
Eduardo Jardim

Natural de São Paulo (SP), Eduardo "Pengor" Jardim é um criador de conteúdo, ilustrador e imaginauta. Criou o Reino do Cogumelo em 2007 e desde então administra e atualiza seu conteúdo, conquistando dois prêmios Top Blog e passagens pela saudosa Nintendo World.

3 Comentários

  1. realmente, se o mario não pulasse, não seria o mario xD
    engraçado como o miyamoto seguiu o caminho certo, mesmo fazendo mtas coisas contra a vontade dele xD

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  2. Na moral, um dos melhores posts do Reino do Cogumelo.

    Esse aqui tinha que ir pro baú de tesouros. D:

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  3. Opa, ele vai pro Baú, no futuro! Ainda faltam as outras partes.

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