Riscos e desafios na criação visual de Donkey Kong Country são revelados por ex-desenvolvedor da Rare em entrevista

Mais de nove milhões de cópias vendidas no mundo todo, marcando o renascimento glorioso do primeiro grande mascote da Nintendo, o gorilão Donkey Kong. O sucesso fenomenal de Donkey Kong Country, lançado para Super Nintendo em novembro de 1994, foi resultado de uma acertada parceria entre a desenvolvedora britânica Rare e a gigante japonesa Nintendo. Tudo começou quando os irmãos Chris e Tim Stamper, fundadores da Rare, decidiram investir em duas estações conhecidas como Silicon Graphics, supercomputadores capazes de gerar gráficos pré-renderizados.

É claro, que, no início da década de 90, máquinas poderosas como essas tinham um preço realmente elevado, mas o retorno do investimento sem dúvida foi bastante positivo para os Stamper. O primeiro projeto em que estas máquinas começaram a ser utilizadas foi um game do estilo boxe, que nunca veio a ser lançado, mas que despertou o interesse da Nintendo. Brendan Gunn, que trabalhou como Programador Técnico no desenvolvimento de Donkey Kong Country, falou um pouco sobre este assunto em entrevista ao site britânico Nintendo Life.

Funcionários do alto escalão da Nintendo nos visitaram na época em que este game de boxe estava sendo feito, e ao ver aquilo fecharam o acordo. A Rare mostrou a eles esta demo em construção com gráficos renderizados, que hoje em dia provavelmente não impressionariam, mas na época as diferenças eram gritantes em comparação a outros games.

Os Stampers então pediram a Nintendo para trabalhar em um novo título estrelando Donkey Kong. Foi então que se iniciou o trabalhoso processo de renderização dos modelos de personagens e cenários de Donkey Kong Country.

A renderização de cada modelo 3D levaria anos. Nós trabalhávamos até às 11 horas da noite, íamos para casa, e de manhã a imagem talvez tivesse acabado de ser renderizada - levava todo esse tempo para as máquinas executarem esta tarefa. Tínhamos uma massiva unidade de ar condicionado só para refrigerar estas máquinas SGI. Podíamos estar sofrendo no verão, mas contanto que o computador não superaquecesse, isso não importava.

Eu me lembro da primeira vez que vi o modelo renderizado de Donkey Kong na tela, e me pareceu uma coisa real, sólida. Nos velhos tempos, as coisas costumavam ser desenhadas à mão no papel, alguém tinha de desenhar uma grade sobre elas e decodificá-las manualmente, então a renderização economizou um pouco de esforço.

Shigeru Miyamoto tinha ideias bem definidas sobre como deveria ser o visual moderno de Donkey Kong, mas Gunn revela que a equipe de desenvolvimento na Rare seguia mesmo era as ordens dos irmãos Stamper, que por sua vez mantinham contato regularmente com a Nintendo. Para assegurar a qualidade do game, os Stamper pressionavam os desenvolvedores a sempre melhorar o que haviam feito, embora dessem liberdade para que todos pudessem ter novas ideias e experimentá-las.

Gunn ressalta que a guerra entre a Nintendo e a Sega na década de 90 exerceu também uma forte influência no desenvolvimento de Donkey Kong Country, já que este tinha de ser um título capaz de evidenciar a superioridade do Super Nintendo sobre o Sega Genesis. No entanto, no final do período de desenvolvimento, a equipe da Rare tomou conhecimento de um game que também estava utilizando a tecnologia SGI: Uniracers, do estúdio DMA Designs.

Começamos a ouvir falar sobre outro jogo com um uniciclo. Falavam que ele tinha gráficos pré-renderizados, e havia aquela preocupação de que estivessem fazendo algo melhor do que nós. Acabamos descobrindo que apenas o uniciclo era feito com SGI. No nosso game, tudo era renderizado, até mesmo os números que mostravam a pontuação; não havia um único elemento desenhado à mão nesse game. Foi um grande alívio saber que a DMA não tinha nos superado nesse aspecto.

Apesar do magnífico resultado final, da recepção calorosa da crítica e das altíssimas vendas, Brendan Gunn afirmou haver um detalhe em Donkey Kong Country que poderia ter sido feito de uma forma mais elaborada por ele: a navegação de Donkey Kong pelos mapas do game.

Quando você navega pelo mapa - que é finamente desenhado com caminhos levando a todos os lugares - acabei fazendo aquele sistema de navegação preguiçoso com pontos ligados por uma linha reta entre cada locação. Ele deveria ter seguido os caminhos em si na verdade. Mas nosso tempo estava esgotado. É algo que eu olho para trás e penso que não consegui fazer da maneira que queria.

Depois do sucesso de Donkey Kong Country, Gunn foi convidado para trabalhar no Project Dream, projeto que mais tarde receberia o nome de Banjo Kazooie, mas preferiu desenvolver as sequências do game de plataforma estrelado pela Família Kong: Donkey Kong Country 2: Diddy's Kong Quest e Donkey Kong Country 3: Dixie Kong's Double Trouble para Super Nintendo, e também se envolveu na criação do tridimensional Donkey Kong 64 para Nintendo 64. Na parte final da entrevista, Gunn, que hoje em dia não trabalha mais na indústria de games, fez questão de enfatizar a importância dos grandes games produzidos pela Nintendo como inspiração para os desenvolvedores da Rare na época.

Olhávamos bastante para qualquer coisa que eles fizessem. Sempre que tínhamos um dilema em algum game, recorríamos a Mario e Zelda para nos guiar quando não tínhamos certeza de como abordar algo. Sinto que, mesmo que tenhamos feito um grande trabalho, sempre pareceu que estávamos copiando a Nintendo. Nós pegaríamos aquilo que eles fizeram, conduzindo levemente a uma nova direção. e trabalhando em cima disso tecnicamente e graficamente.

Eles foram uma influência enorme em tudo o que fizemos; não penso que houve qualquer competição. Se pudéssemos aperfeiçoar um conceito e torná-lo melhor em alguns aspectos, então ótimo. Atualmente, tenho certeza que muitas pessoas vão argumentar dizendo que a Nintendo produziu muitos games melhores - Goldeneye à parte, que indiscutivelmente teve um conjunto de influências totalmente diferentes - mas nós admirávamos eles, e queríamos colocar nossa marca nas coisas.

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