O crash dos video games de 1983

Série nova no Reino do Cogumelo! Hoje em dia, todo o cara que leva video games a sério conhece a história do famoso crash dos video games de 1983. Trata-se de um desastre ocorrido nos Estados Unidos entre os anos de 1983 e 1984, que afetou massivamente o mercado de jogos eletrônicos da época e trouxe um fim extremamente súbito à segunda geração de consoles na terra do Tio Sam. A tragédia quase arregaçou com a indústria e causou a falência de inúmeras companhias de video games; o crash durou estimadamente dois anos. A indústria de video games se reergueu pouco tempo depois, graças principalmente ao sucesso definitivo do Nintendo Entertainment System, o nosso querido Nintendinho. Houveram muitas razões para que o crash acontecesse, mas a causa principal foi o excesso extremo de consoles e jogos de qualidade péssima. E é claro... E.T., o Extraterrestre.

Excesso de consoles e jogos tão ruins que teus ancestrais vão te pedir pra não enterrar. Acontece que sem um precedente estabelecido, a indústria não estava preparada pra levar os consoles pra próxima geração. Também, nos Estados Unidos, o mercado foi floodado até o pescoço de tantas variedades, e escolhas. Na época do crash, você tinha o Atari 2600, Atari 5200, Bally Astrocade, ColecoVision, Coleco Gemini (clone do 2600), Emerson Arcadia 2001, Fairchild Channel F System II, Magnavox Odyssey², Mattel Intellivision, Intelivision II, os sistemas de jogo Sears (que incluíam clones do 2600 e Intellivision), TandyvisioN (mais um clone da Intellivision pra RadioShack, e o Vectrex. Ou seja, pelo amor de Deus! Cada um desses consoles possuía um catálogo enorme de jogos, e muitos também tinham uma lista gigantesca de jogos de third-party. Além de tudo, um monte dessas companhias prometeram uma nova geração de consoles em 84, como o Odyssey 3 e o Atari 7800. Somado às consternações e barracos da indústria, houve um excesso de títulos pobres trazidos por empresas iniciantes. Tais jogos, combinados com a qualidade mendiga dos games do Atari, como a versão em video game do filmaço da época, E.T. - O Extraterrestre, e uma versãozinha safada de Pac-Man pra 2600, danificaram seriamente a reputação da indústria.

A competição com os computadores pessoais foi mais um dos fatores que geraram o terrível crash. Até o final dos anos 70, computadores pessoais (vulgos PCs) estavam sendo vendidos por mais de 3300 dólares atuais, se fizermos os cálculos. No entanto, no começo dos anos 80, muitas companhias lançaram PCs que eram conectados a uma TV ajustada e ofereciam gráficos coloridos e melhoria sonora. O primeiro desses sistemas foi o Atari 400 e 800, mas muitos modelos surgiram pra competir pela atenção do consumidor. Pelo fato de que outros PCs geralmente possuíam mais memória disponível, e melhores gráficos e capacidades sonoras do que um console, eles permitiam jogos mais sofisticados e poderiam também ser usados pra fazer contas ou escrever textos. Também, os jogos dos PCs eram muito fáceis de copiar, já que vinham em disquetes e fitas cassete ao invés de módulos ROM. O uso de um estoque gravável permitia que os jogadores pudessem salvar seus progressos nos jogos, o que era bastante útil devido à complexidade ampliada dos computadores. Isso não existia em nenhum console disponível da época. A Commodore jogou sujo contra os video games, fazendo propaganda comercial sobre a compra de um Commodore 64 e sugerindo que crianças do colégio precisariam de próprios PCs, e não video games.

Outro fator interessante foi a perda do controle de publicação. Sabia que a Activision é co-fundada por programadores da Atari que deixaram a companhia em 1979 porque ela não permitia que os créditos aparecessem nos jogos e não pagava os empregados a grana baseada nas vendas? Assim que a rebelião conhecida como Activision entrou na estrada, a Atari a processou na intenção de bloquear as vendas dos produtos, mas perdeu o caso em 1982. Esse caso jurídico tornou legítimo o desenvolvimento third-party, encorajando companhias como a Quaker Oats (aquela das bolachinhas) a abrir divisões de video games, esperando impressionar os consumidores. As empresas atraíram os programadores umas das outras ou usavam engenharia reversa pra aprender sobre como fazer jogos pra sistemas proprietários. Pra você ter uma ideia, a Atari até mesmo contratou um bando de funcionários do estúdio de desenvolvimento da Intellivision, da Mattel. Resultado? Uma ação judicial em cima da Atari que incluía acusações de espionagem industrial.

Apesar das lições aprendidas pela Atari na perda de seus programadores, que rumaram felizes e contentes pra Activision, a Mattel continuou evitando creditar os designers dos jogos. Ao invés de revelar os nomes das pessoas por trás do desenvolvimento dos jogos da Intellivision, a Mattel requeriu que uma entrevista com eles no TV Guide em 1981 mudasse seus nomes pra proteger suas identidades coletivas. Os designers da ColecoVision trabalharam de um modo similarmente obscuro, alimentando ainda mais concorrência.

Ao contrário do que a Nintendo, Sony ou Microsoft fazem nas décadas seguintes, os manufatores de hardware daquela época perderam o controle exclusivo dos jogos de suas plataformas. Com isso, eles também perderam a habilidade de garantir que as lojas nunca seriam sobrecarregadas com produtos. A Activision, Atari e Mattel tinham programadores experientes, mas muitas das novas companhias - correndo pra entrar no mercado - não tinham experiência o bastante e talento pra criar jogos. Títulos no escalão de Chase the Chuck Wagon (sobre cães comendo ração, trazido a você pela Purina), Skeet Shoot e Lost Luggage foram exemplos de jogos nos quais as companhias depositavam sua fé e suas moedinhas. Mas, apesar de fortemente anunciados e produzidos, esses jogos provaram ser de má qualidade e só trouxeram desgraça à indústria.

Certamente, um dos culpados mais conhecidos pela queda massiva dos video games foi um baixinho de olhos grandes e dedos reluzentes. Quando a Atari começou a anunciar fortemente o jogo E.T. (baseado no sucesso de Steven Spielberg, lançado em junho de 1982), ela manufaturou milhões de unidades antecipando um sucesso devastador. Mas, o jogo foi arrancado do mercado em menos de seis semanas. A reputação horrível do jogo se espalhou pelo mundo todo como uma doença, e a história diz que E.T. foi o primeiro grande fracasso absoluto da era dos video games. O resultado final foi um número altíssimo de unidades retornadas e não-vendidas. Somado aos custos altíssimos da licença do filme, E.T. se tornou uma catástrofe industrial para a Atari. Os milhares de cartuchos indesejados se tornaram parte do famoso Enterro de Video Games da Atari de 1983...
Eduardo Jardim

Natural de São Paulo (SP), Eduardo "Pengor" Jardim é um criador de conteúdo, ilustrador e imaginauta. Criou o Reino do Cogumelo em 2007 e desde então administra e atualiza seu conteúdo, conquistando dois prêmios Top Blog e passagens pela saudosa Nintendo World.

7 Comentários

  1. Jardim, tem um erro que precisa ser corrigido: o Cammodore 64 não foi um console nem foi um fracasso, foi um dos modelos de computadores mais vendidos de seu tempo!
    Grande abraço!

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  2. Ah, sim!
    E vc não pode usar o termo PC para computadores antigos, já que eles seguiam arquiteturas diferentes do PC. PC e computador não são termos equivalentes. Quando vc fala em computadores, vc fala do tipo de maquina, quando fala PC fala de sistemas compativeis com o PC/AT da IBM, como a maioria dos computadores vendidos hoje em dia. Por exemplo é errado chamar um Mac ou um Commodore 64 de PC...

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  3. Ops, confundi com o Commodore 64 Games System, e esse sim, foi um desastre. Quanto a PC, me refiro à sigla Personal Computer http://en.wikipedia.org/wiki/Personal_computer , que abrange os computadores pessoais desde os anos 70. O primeiro PC completo foi o Commodore PET em 1977, mas entendo a inclusão da IBM na terminologia, devido à forte campanha comercial em 81. No entanto, obrigado pelos apontamentos.

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  4. O Atari tem centenas dejogos horriveis. Já joguei vários jogos dele por emuladore depois me perguntei:
    Quem é que comprava uma fita (que na épca acredito que era cara)com um jogo tão pequeno, chato e sem lógica?`
    Pelo menos tem alguns clássicos que salvaram, como River raid, Enduro(esse minha mãe tinha no atari dela, pena que ele quebrou antes mesmo deu nascer!) e Frog(esse eu adoro).

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  5. Matéria muito boa, me informei sobre coisas que antes eram totalmente desconhecidas para mim.

    Ah, Jardim, tem uma notícia importante para os usuários de Wii: http://www.wii-brasil.com/?sec=lernoticia&id=25149

    Engraçado esse fix 4.2 dar problema em videogames "limpos" justamente quando chega uma nova responsável pela qualidade das coisas da Nintendo.

    Esse fix 4.2 tem causado sérios problemas aos usuários de Wii, pelo que achei no Google.

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  6. booooaaa!
    apesar de já conhcer boa parte da historia, foi realmente muito bom ter um outro olhar!

    tamos esperando pela continuação!

    abraços meu bom, Fuiz!

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  7. Sabiam que o jogo E.T., o Extraterrestre,foi um fracasso tão intenso que um exemplar do jogo foi enterrado no deserto do novo méxico!é bizarro!Mas é pura verdade.

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